O título desta crônica mais parece um trava-língua, do que a rotulação de alguns comentários que pretendo fazer nos próximos minutos. No entanto a coisa é bastante séria, independente do título que parece ter surgido de um teste fonoaudiológico.
Os druidas eram uma espécie de sacerdotes, de ministros religiosos, que se colocavam como intermediários entre os celtas e seus deuses. Essa civilização, que existiu entre o segundo milênio a.C. e o século I d.C., quando Cláudio conquista a Bretanha e a incorpora ao Império Romano, tinha nas árvores um símbolo ideal de ligação entre o céu e o espaço onde viviam. Não edificavam templos nem igrejas, o santuário era o próprio bosque, onde o altar-mor surgia sempre, junto a um imponente carvalho. Homens e mulheres adoravam a vida representada por: choupos, aveleiras, ciprestes e sorveiras sentados na relva, enquanto oravam na esperança de que essas árvores intercedessem, levando cada súplica à Danu, a Grande-Mãe, Deusa da Terra.
Pois é, um povo simples, uma cultura primitiva onde a natureza era merecedora de respeito, desapareceu, deixando apenas fábulas e as andanças de Asterix, seu herói mais notável. Na Grã Bretanha, como também: na França, na Bélgica, na Holanda, na Dinamarca e em todo o território ocupado hoje, pela Alemanha, há um sentimento saudosista. Um sentimento quase nostálgico de uma época que, apesar de desprovidos de qualquer conforto, puderam respirar ares diáfanos e ouvir um trovador distante, cujo canto era acompanhado por flautas, gaitas-de-foles, uma harpa e um bodhram.
Por aqui, nas Américas sulinas, nossos antepassados autóctones veneravam, igualmente, as árvores, até o momento em que a civilização começou a pedir cada vez mais espaço. A jurema, no nordeste brasileiro; o ipê-roxo e o laurel, na República Guarani; o yopo, na região do rio Orinoco; o vilca dos Incas; as araucárias e os canelos, dos Mapuches; o algarrobo, dos índios Diaguitas que habitavam o noroeste argentino e muitas outras essências preciosas, deram lugar à sociedade atual que tenta organizar civilmente, suas cidades cada vez mais apinhadas, ingratas e cansadas.
Contemplo, enquanto escrevo tudo isto, uma paisagem estuprada e resignada a trocar o verde vivo, pelo sombrio e lânguido cinza que avança sem parar. Os dendrocidas, antes escondidos pela noite, matam árvores em pleno dia, alegando necessidades urbanísticas urgentes. Ao passo que você, eu e todos aqueles que ainda conservamos o velho hábito de respirar ar puro e nos deleitar com coisas simples, como andar sob uma alameda de jacarandás salpicados de pétalas roxas, devemo-nos conformar com a rotina quase desidiosa, que nos leva a enfrentar um trânsito lento, para ir e vir molengamente, por este mundo civilizado.
Por Raul Cânovas