Em certa ocasião, Buda, sentado no jardim, diz: “A paz vem de dentro de você mesmo. Não a procure à sua volta”.
O modo de agrupar plantas e pedras em pequenos espaços externos tem nos países asiáticos um sentido muito mais religioso do que estético. Aqui no ocidente, o jardim sempre foi um símbolo de poder e de status desde o império romano, passando pelo Renascimento até os impecáveis parques ingleses do século XIX. No oriente não foi assim, é impressionante como esse pedaço do planeta seguiu uma trajetória tão diferente da Europa e da América. Ali, por causa do Budismo, do Xintoísmo, do Taoismo e também do Confucionismo, existia uma necessidade espiritual de contemplar a natureza. Lao Tse falava que “não há nada mais suave e frágil do que a água, e no entanto, nada é tão eficaz para atacar as coisas duras e fortes”. 600 anos antes de Cristo, ele pregava uma forma de vida de acordo com o Tao, que quer dizer caminho ou roteiro e que nos leva sempre obedecer nossos impulsos naturais, afastando-nos de todo e qualquer artificialismo. Lao Tse, que foi o fundador do taoismo, insistia para que seus seguidores mantivessem a simplicidade original da natureza humana e, para que isto fosse possível, era fundamental a contemplação da natureza que nos rodeia. Por este motivo, tanto o Taoismo como o Confucionismo despertaram nos chineses a necessidade de criar uma ligação com o divino através das árvores que cresciam espontaneamente nos campos e que, mais tarde, levariam para perto de suas casas; não pelo afã de possuí-las, mas sim pela vontade de sentir que o sagrado estava junto a eles.
Quando o Budismo se propagou pela China no primeiro século da era cristã, coincidentemente também se iniciava a idade de ouro nas artes plásticas, na poesia, na porcelana e na arte de construir jardins. Os japoneses soltavam a imaginação tentando reproduzir perto de onde moravam as paisagens favoritas que tinham contemplado em lugares remotos.
Aquele lago salpicado de ilhas, as montanhas, os caminhos tortuosos; tudo era reproduzido em escala perfeita dentro dos limites de um pequeno jardim. Construíam pequenos espelhos d’água atravessados por pontes de onde se podia contemplar o contorno de maneira quase que filosófica. Neste panorama sempre se incluíam trilhas de areia rastelada e pedras para aumentar a sinuosidade e a profundidade.
As pedras têm uma importância enorme nos jardins da China e do Japão, elas não representam apenas as montanhas, têm um peso próprio através das formas e tamanhos. A própria tonalidade e textura transformam cada corpo calcário em uma coisa única, e a maneira como elas preenchem os espaços dão um significado muitas vezes até místico ao jardim.
Eu não saberia explicar porque os chineses deram tanta importância às pedras, porque davam ênfase ao Ficus que era a árvore onde o Buda atingiu a revelação; mas por qualquer motivo, talvez clima, na China houve uma preferência pelas pedras em lugar das árvores.
O que para nós ocidentais chama a atenção é a maneira descontraída que os jardineiros chineses tinham na hora de delinear um jardim, existiu sempre neles e, mais tarde nos japoneses e coreanos, uma sensibilidade e uma entrega total na hora de criar um espaço verde ou de transformar os simples caracteres da escrita em uma obra de arte caligráfica.
Certa vez li um pequeno texto de um autor chinês que dizia que: “levar para o mar as flores mutiladas pela neve, visitar os crisântemos durante uma geada, cuidar da orquídea enquanto a chuva cai, ou ouvir o balanço dos bambus sacudidos pelo vento, são as alegrias do homem simples que não tem nada importante para fazer; mas também são acontecimentos de grande valor para alimentar o espírito do erudito”.
Autor: Raul Cânovas