A Igreja celebra o Dia dos Fieis Defuntos há quase dez séculos, uma prática de quase dois mil anos
Saudade (1899), por Almeida Júnior
Em alguns países, como é o caso do México, é uma festa com grande atração turística. Lá, nesta data, organizam banquetes homenageando seus mortos para que estes visitem suas famílias e participem da comilança e das alegrias de todos aqueles que amaram em vida. Por aqui é diferente, as pessoas lembram-se dos queridos ausentes para sempre de modo melancólico. Alguns vão até o cemitério cumprindo uma espécie de ritual, carregando flores e soltando uma lágrima ao contemplar, cabisbaixos, o túmulo que os guarda. Outros, sem sair de casa, se deparam com o retrato que descansa na prateleira e o miram de maneira nada analítica, apenas tomando-o como um liame de ligação com o passado.
Saudade é a palavra que paira nas mentes de todos, não há como não lembrar. Por todos os lados a data é mencionada de forma a não se esquecer da ausência daquele que não ouvimos mais e tem a força ainda de deter o tempo, para que sintamos um aperto no peito. Sentir a falta, sentir, quem sabe, a dor de não ter dito a tempo algo que precisávamos ter-lhe confessado. Sentir e não senti-lo junto perfumando o ar que respiramos. Sentir nostalgias úmidas que nos molham o rosto.
Como é difícil entender algo tão definitivo, o abraço impossível, o beijo truncado para sempre, a falta desse ouvido cúmplice que tudo aceitava.
Escabiosas-roseas
Quero sonhar-me jardineiro poderoso, carregando um carrinho de intermináveis escabiosas-roseas, para plantá-las junto a todos os que se foram. Ser, por um dia, o plantador das flores que enfeitem o sonho definitivo daqueles que não receberam visitas de ninguém e que contemplam, desde muito longe, um simbólico jardim abandonado, no mais triste dos condomínios.
E antes de acordar, caminhar pelo vazio material, sabedor de que isto é melhor do que o esquecimento.
Autor: Raul Cânovas